Paisagem, 1915-1917 (EUA, Costa do Maine)
Um dos períodos de maior produção
artística de Anita Malfatti foi durante sua estadia nos Estados Unidos,
quando a artista se isolou numa ilha de pescadores na Costa do Maine chamada Monhegan Island (nome que serve de subtítulo a um dos quadros da época: Rochedos). Anita vivia com outros pintores que trabalhavam sob a orientação do pintor e filósofo Homer Boss, da Independent School of Art.
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Rochedos (Monhegan Island). 1915. oléo s/ tela (60x74) .Col. Guilherme Malfatti, SP |
Anita passava os dias pintando ao ar livre, e ao anoitecer ouvia as
aulas inspiradas de Homer Boss. Nesse ambiente de liberdade e
inspiração, a artista explorou as influências expressionistas adquiridas
durante seu aprendizado anterior na Alemanha. Em obras como A Ventania e A Onda , a
paisagem local é representada como uma força selvagem, agressiva e
dinâmica, e o uso da deformação expressa certa inquietação do olhar
humano diante da natureza.
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A Ventania. 1915-17. óleo s/ tela (51x61). Col. Palácio dos Bandeirantes, SP. |
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A Onda. 1915-17. óelo s/ madeira (26,5x36). Col. Paulo Prado Neto, SP. |
Uma das obras mais conhecidas desse período é O Farol. Nessa pintura, assim como em O Barco,
a paisagem está mais harmonizada com a presença humana, através das
edificações que compõem o cenário. O uso da deformação é sensivelmente
menor, em contrapartida Anita utiliza exemplarmente a principal
característica do seu expressionismo: as cores abundantes e vivas, a
chamada “Festa da Cor”.
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O Farol. 1915. óleo s/ tela (46,5x61). Col. Chateaubriand Bandeira de Mello, RJ.
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O Barco. 1915. óleo s/ tela (41x46). Col. Raul Sousa Dantas Forbes, SP. |
Entre as obras que fomentaram as
polêmicas em torno da lendária exposição de 1917, certamente estão
muitos dos retratos pintados por Anita.
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A estudante russa. 1915. óleo s/ tela (76x61). Col. Mário de Andrade, Instituto de Estudos Brasileiros da USP, SP. |
Tanto nas paisagens quanto nos retratos, a cor é o principal instrumento da jovem Anita Malfatti. A obra O homem de sete cores revela essa preocupação intensa, e essa técnica também irá produzir grandes telas como A boba.
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O homem de sete cores. 1915-16. Carvão e pastel s/ papel (60,7x45). Col. Roberto Pinto de Souza, SP. |
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A boba. 1915-16. Óleo s/ tela (61x50,5). Col. Museu de Arte
Contemporânea da USP, SP.
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Anita utilizava modelos que posavam na
Independent School of Art em troca de alguns dólares. Essas pessoas, sem
nenhuma ligação com o mundo artístico, serviriam como modelos para
obras como A mulher de cabelos verdes e O homem amarelo, obra que fascinou Mario de Andrade, quando este sequer conhecia Anita.
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A mulher de cabelos verdes. 1915-16. óleo s/ tela (61x51). Col. Ernesto Wolf, SP. |
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O homem amarelo. 1915-16. óleo s/ tela (61x51). Col. Mário de Andrade, Instituto de Estudos Brasileiros da USP, SP. |
Nessas obras, assim como em Uma estudante, Anita
revela o seu interesse em retratar o estado psicológico dos seus
modelos. O uso de certa deformação moderada, fugindo dos modelos
clássicos, causou grande alvoroço em Monteiro Lobato e na elite
provinciana de São Paulo.
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Uma estudante. 1915-16. óleo s/ tela (76,5x60,5). Col. Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, SP. |
A recepção negativa da Exposição de 1917 fez com Anita recuasse
nas suas propostas inovadoras para a pintura, assim como afastou a
possibilidade de alcançar o Pensionato Artístico do Estado de São
Paulo, almejado pela artista desde 1914. No entanto, apesar do
escândalo geral, algumas forças ansiosas por renovação cultural já
procuravam apoiar e defender a artista. Entre eles está Mario de Andrade
(retrato abaixo), grande admirador da pintora, que após a Semana de
Arte Moderna de 22 cresceu em importância no cenário cultural paulista.
Foi por intermédio de Mario de Andrade que Anita conseguiu o
Pensionato Artístico do Estado de São Paulo, e em 1923 a pintora partiu
para a França.
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Mario de Andrade I. 1921-22. óleo s/ tela (51x41). Col. Particular, SP. |
Anita também retratou outros de seus amigos, inclusive a escritora portuguesa Fernanda de Castro.
No entanto, muitas de suas composições eram inspiradas em anônimos,
vistos ao acaso pela rua, que chamavam a atenção da artista. Entre elas
estão a Chanson de Montmartre e Mulher do Pará.
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Fernanda de Castro. 1922. óleo s/ tela (73,5x54,5). Col. Marta Rossetti Batista, SP. |
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Chanson de Montmartre. 1926. óleo s/ tela (73,3x60,2). Col. Roberto Pinto de Souza, SP. |
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Mulher do Pará (no balcão). 1927. óleo s/ tela (80x65). Col. Jenner Augusto Silveira, Salvador. |
Paisagem, 1924-26 (França, Pensionato Artístico).
Ao receber o Pensionato Artístico do
Estado de São Paulo, graças ao seu apoiador Mario de Andrade, Anita
parte para a França, para retomar seus estudos e dedicar-se unicamente à
pintura (no Brasil, ela lecionara artes plásticas e pintara sob
encomenda para sobreviver).
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Porto de Mônaco. 1925-26. óleo s/ tela (80x64,5). Col. Jenner Augusto Silveira, BA. |
A artista também viajaria para a
Itália, onde iniciaria um processo de estudo dos clássicos, inclusive
realizando réplicas e versões de pintores renascentistas, além de
retratar a paisagem local.
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Paisagem dos Pirineus (Cauterets). 1926. óleo s/ tela (45,8x54,8). Col. Liliana Maria Assumpção, SP. |
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Veneza (Canaleto). 1924. óleo s/ tela (51,5x63). Col. Museu de Arte Brasileira da FAAP, SP. |
Apesar do recuo da atitude de
vanguarda, Anita ainda era capaz de produzir grandes obras, sem
abandonar a sua influência do humanismo expressionista, revelando a
preocupação introspectiva e psicológica da artista.
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La rentrée (interior). 1925-27. óleo s/ tela (88x115). Col. Pedro Tassinari Filho, SP. |
Paisagem, 1940-49 (Brasil).
No final da sua carreira, Anita transforma radicalmente seu jeito
de pintar. Ela declara querer abandonar as fórmulas internacionais, e
pintar de forma cada vez mais simples. A temática também muda: a
instrospecção, e os retratos de forte expressão psicológica são
substituídos pela representação da “alma brasileira”. Segundo a própria
artista: “É verdade que eu já não pinto o que pintava há trinta anos.
Hoje faço pura e simplesmente arte popular brasileira. É preciso não
confundir: arte popular com folclore. (…) eu pinto aspectos da vida
brasileira, aspectos da vida do povo. Procuro retratar os seus costumes,
os seus usos, o seu ambiente. Procuro transportá-los vivos para as
minhas telas. Interpretar a alma popular (…) eu não pinto nem folclore,
nem faço primitivismo. Faço arte popular brasileira”
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As duas Igrejas (Itanhaém). 1940. óleo s/ tela (53,8x66). Col. Particular, SP. |
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Cambuquira. 1945. óleo s/ tela (50x61,1). Col. Museu de Arte Contemporânea da USP, SP.
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Anita procurava transmitir a “ternura brasileira” que não encontrava
na arte da época. Para transmitir essa mensagem, achou que a sua técnica
antiga era “muito violenta, inacessível à massa” – assim, procurava uma
técnica simples, acessível a todos. Procurou cada vez mais esquecer
escolas, teorias. Chegaria a declarar, em 1957, que estava “tentando
pintar apenas a vida, sem quaisquer preocupações artísticas”, concluindo
mesmo: “Se conseguir fazer isso, estarei satisfeita”.
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Itanhaém. 1948-49. óleo s/ tela (72x92). Col. Manuel Alceu Affonso Ferreira, SP. |
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Samba. 1943-45. óleo s/ tela (39,9x49,3). Col. Gabriel de Castro Oliveira, SP. |
(Fonte: http://obrasanitamalfatti.wordpress.com/ )
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