Principais artistas que participaram da Semana da Arte Moderna e suas obras.

sábado, 14 de setembro de 2013

     Falar sobre os artistas da Arte Moderna significa falar sobre o maior evento que marcou a história da arte brasileira. Tal evento, conhecido como a Semana de Arte Moderna, ocorreu no Teatro Municipal de São Paulo, entre os dias 13 e 18 de fevereiro de 1922.
     Partindo dessa data (1922), começamos a compreender os reais propósitos firmados mediante o histórico acontecimento. Afinal, por que 1922? Essa é a data em que o Brasil comemorou seu primeiro centenário da Independência, embora essa independência em nada tenha transformado os planos político, econômico ou cultural. Dessa forma, desde o período que antecedeu a Semana de 1922, conhecido como Pré-Modernismo, houve uma reação por parte da classe artística em revelar um Brasil visto sob o plano real, longe do idealismo pregado pela era romântica. Um Brasil dos marginalizados, indo desde o sertão nordestino até os subúrbios cariocas. Não por acaso, Euclides da Cunha, Monteiro Lobato, entre outros, souberam expressar sua insatisfação mediante as mazelas que corrompiam a sociedade daquela época – de um lado o progresso industrial oriundo da expansão do capitalismo, de outro a massa dos excluídos, formada pela classe operária que, cada vez mais organizada, realizava intensas greves.
    Nesse clima de euforia, imbuídos no propósito de operar mudanças, sobretudo influenciados pelos movimentos vanguardistas, é que os artistas expressaram seus posicionamentos ideológicos por meio de suas criações, seja na pintura, música, escultura, literatura, entre outras formas de arte. Principais autores e suas obras abaixo.

(Fonte: http://www.brasilescola.com/literatura/artistas-da-arte-moderna.htm )

Obras Apresentadas na Semana da Arte Moderna de 1922

         Com certeza um dos acontecimentos mais importantes para que o mundo artístico pudesse ter um grande impulso no Brasil, a Semana da Arte Moderna aconteceu em 1922 no Teatro Municipal de São Paulo, onde muitas obras foram apresentadas num período de três dias. O maior objetivo que foi imposto pela Semana da Arte Moderna era fazer com que o padrão de estilo acadêmico para obras fosse retirado das tradições no Brasil, oferecendo assim uma nova era com artes mais renovadas.
     A Semana da Arte Moderna teve três dias de duração, no primeiro dia (13/02/1922) foram apresentadas obras de pintura e escultura, no segundo dia (15/02/1922) foram apresentadas obras de poesia e literatura, e no terceiro dia (17/02/1922) foram apresentadas obras musicais. Uma das idéias que os responsáveis pelo evento queriam transmitir para o público, era atualizar a cultura artística do Brasil, para que assim a visão fosse ampla.
     Veja abaixo um breve resumo com imagens de obras apresentadas em cada dia da Semana de Arte Moderna:
     Dia 13 de fevereiro – Graça Aranha pronunciou uma conferência tendo como tema “A Emoção Estética na Arte”, ela elogiou e comentou sobre várias obras de arte expostas, principalmente quadros pintados por grandes nomes;
Mario de Andrade – Anita Malfatti

A Estudante Russa – Anita Malfatti
        Dia 15 de fevereiro – Oswald de Andrade apresentou vários de seus poemas e Mário de Andrade fez um discurso literário sobre o tema “A escrava não é Isaura”;
 
Brasil – Oswald de Andrade
 
Beleza – Menotti Del Picchia

Villa-Lobos

            Figura incontestável da história da musica brasileira, o compositor Heitor Villa-Lobos nasceu no Rio de Janeiro, em 5 de março de 1887.

        Perdeu o pai ainda jovem e, por causa disso, sua mãe, dona Noêmia, teve de trabalhar duro para sustentar a família. A drástica mudança de uma vida estável para uma vida difícil deu a Villa-Lobos uma grande liberdade. Tratou de aproximar-se de seu ídolos, os "chorões", músicos que tocavam chorinho no Rio. Pagava-lhes, sempre que podia, uma dose de pinga, que era financiada por meio da venda dos livros da biblioteca de seu falecido pai.

         Durante sua mocidade, Villa-Lobos conheceu e tornou-se grande amigo do pianista polonês Arthur Rubinstein. Os dois encontraram-se pela primeira vez em um Carnaval. Rubinstein, vestido de mulher, fez amizade com Villa-Lobos, que enrolara uma cobra de verdade no pescoço, e foram, os dois, brincar o carnaval. Acabaram na delegacia de polícia.

          Como dona Noêmia não abria mão de ver seu filho no curso de medicina, Villa-Lobos acabou se matriculando no curso de preparação para o exame vestibular de medicina, obedecendo as vontades de sua mãe. Porém, o jovem, acompanhado da sabedoria que seus 16 anos de vida lhe garantiam, não queria aquela história para sua vida. Fugiu de casa e foi refugiar-se na casa da tia Fifina, para ter maior liberdade para frequentar os chorões e tocar em pequenas orquestras.

          Villa-Lobos fez isso dos 18 aos 26 anos. Viajou pelo Brasil se apresentando como músico e teve um contato cada vez mais intenso com o folclore brasileiro. É nesse período que compôs "Amazonas" e "Uirapuru".

           Depois desse período de andanças pelo Brasil, Villa-Lobos retorna ao Rio, em 1913, e sua obra começa a avolumar-se com as composições de "Cânticos Sertanejos", "Brinquedo de Roda", "Sonata Fantasia nº 1" e as óperas "Aglaia" e "Elisa".

           O passo seguinte na carreira de Villa-Lobos foi a sua importante atuação na Semana de Arte Moderna de 22, em que promoveu as primeiras apresentações de suas obras. Apresentou, no dia 13 de fevereiro, a "Segunda Sonata", o "Segundo Trio" e a "Valsa Mística", o "Rondante", "A Fiandeira" e "Danças Africanas". No dia 15, "O Ginete do Pierrozinho", "Festim Pagão", "Solidão", "Cascavel" e "Terceiro Quarteto". No dia 17, "Terceiro Trio", "Historietas", "Segunda Sonata", "Camponesa cantadeira" e "Num Berço Encantado".

           Em 30 de junho de 1923, Villa-Lobos embarcou no navio francês Croix, deixando o Rio com destino à Europa. Sua viagem não foi para estudar ou aperfeiçoar-se, mas para exibir o que já havia produzido. Não agiu como a maioria do brasileiros, que voltam vaidosos de seus estudos. Villa-Lobos chegou à Europa com a cabeça feita e se impôs em menos de um ano. Nenhum outro autor estrangeiro vindo de um país como o Brasil daquela época teve tanto sucesso em Paris como Villa-Lobos.

           Ao voltar ao Brasil, em 1930, Villa-Lobos já era um músico em plena maturidade, consciente de seu valor e autor de uma bagagem equivalente à produção total de muitos artistas. Nesse mesmo ano, fez uma turnê pelo país, percorrendo 66 cidades, além de ter organizado a Cruzada do Canto Orfeônico, no Rio.

          Nos anos seguintes, teve uma importante atividade como educador e divulgador musical. Uma de suas contribuições foi a criação da Orquestra Villa-Lobos. Foi também Secretário da Educação Musical no governo Getúlio Vargas e tornou obrigatório o ensino de música nas escolas.

         Em 1945, Villa-Lobos, criou, no Rio, a Academia Brasileira de Música e foi seu primeiro presidente. Dois anos depois, é convidado para ir aos EUA, afim de escrever, junto com os libretistas Forrest e Wright, a opereta Magdalena.

           Morreu em 17 de novembro de 1959, no Rio, vítima de uma crise de uremia viria. 


(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/especial/2002/semanadeartemoderna80/personalidades-villa_lobos.shtml )

Mário e Oswald de Andrade: destaques da Semana de Arte Moderna

Nunca antes, e nunca depois, a cidade reuniu um grupo de jovens capaz de fazer tanto barulho 
        Como dizia o refrão do saudoso cronista social, não convidem para a mesma mesa Mário de Andrade e Oswald de Andrade. Tem gente que os supõe irmãos. Não tinham nenhum parentesco. Outros os imaginam cada um a metade de um mesmo todo. Foram durante uns poucos anos, logo tomaram rumos diversos. Pelo menos, defenderão terceiros, foram amigos. O período de amizade foi menor do que o da inimizade. Escreveu Mário de Andrade, em 1933, numa carta a Manuel Bandeira, que odiava Oswald tão “friamente”, tão “organizadamente”, que não lhe ofereceria “um pau à mão, pra que ele se salvasse de afogar”.

        Mário (1893-1945) e Oswald (1890-1954) foram os mais destacados participantes da famosa Semana de Arte Moderna, realizada no Teatro Municipal em fevereiro de 1922. Nesse tempo, a parceria funcionou como a alavanca que jogou São Paulo, a São Paulo ainda provinciana, mas crepitante de uma riqueza que do café se desdobrava em centro industrial, para o centro da renovação artística e cultural do país. Nunca antes, e nunca depois, a cidade reuniu um grupo de jovens capaz de fazer tanto barulho. Com suas inovações estéticas, Mário e Oswald são os porta-estandartes de outra espécie de emancipação paulista, depois da econômica: a emancipação cultural.
        Os temperamentos eram diferentes. Mário, se teve uma fase iconoclasta nos tempos da Semana, evoluiu para tornar-se a figura seminal que, com seus ensaios, críticas e, principalmente, as cartas que generosamente escrevia a interlocutores disseminados pelo Brasil afora, serviria de ponto de referência a mais de uma geração de escritores brasileiros. Oswald foi iconoclasta a vida inteira, e ao iconoclasta acrescentava uma porção bufão, tanto nos movimentos literários que fundava (Pau-Brasil, Antropofagia) quanto numa vida pessoal em que ia trocando de mulher como só em Hollywood, nesse tempo, e mesmo depois, se ousava fazer. Os dois tiveram em comum o fato de cantarem insistentemente a cidade natal, no momento mesmo em que, entre o susto, a ironia e o deslumbramento, a imaginavam disparando rumo ao futuro.
Oswald:
'A felicidade anda a pé
Na Praça Antônio Prado
São 10 horas azuis
O café vai alto como a manhã de arranha-céus'
(Poema 'Aperitivo')
Mário:
'Guardate! Aos aplausos do esfuziante clown,
heroico sucessor da raça heril dos bandeirantes,
passa galhardo um filho de imigrante,
loiramente domando um automóvel!'
(Poema 'O Domador')
Oswald:
'Tome este automóvel
E vá ver o Jardim New-Garden
Depois volte à rua da Boa Vista
Compre o seu lote
Registre a escritura
Boa firme e valiosa
E more nesse bairro romântico
Equivalente ao célebre
Bois de Boulogne
Prestações mensais sem juros'
(Poema 'Ideal Bandeirante')
Mário:
'Minha Londres de neblinas finas!
Pleno verão. Os dez mil milhões de rosas paulistanas.
Há neve de perfumes no ar.
Faz frio, muito frio...
E a ironia das pernas das costureirinhas
parecidas com bailarinas...'
(Poema 'Paisagem Nº 1')
Oswald:
'Arranha-céus
Fordes
Viadutos
Um cheiro de café
No silêncio emoldurado'
(Poema 'Atelier')
Mário:
'São Paulo! comoção de minha vida...'
(Poema 'Inspiração')
Brincadeiras ferinas e provocações de Oswald causaram o rompimento entre os dois Andrade, em 1928. Une-os hoje o solo hospitaleiro do Cemitério da Consolação.

(Fonte: http://vejasp.abril.com.br/materia/veja-sao-paulo-25-anos-mario-oswald-de-andrade )

Poesia ( Menotti Del Picchia )

 
Menotti Del Picchia 

Máscaras
       
 
PERSONAGENS:  Arlequim : Um desejo 
Pierrot     : Um Sonho 
Colombina: A Mulher 
                        Em qualquer terra em que os homens amem. 
                        Em qualquer tempo onde os homens sonhem. 
                                                        Na vida. 
                BEIJO DE ARLEQUIM 
                 I 
                O crescente cintila como uma cimitarra. Lírios longos, grandes mãos
                brancas estendidas para o luar, bracejam nas pontas das hastes. Uma
                balaustrada. Uma bandurra. Um Arlequim. Um Pierrot E, sobre as
                máscaras e os lírios, a volúpia da noite, cheia de arrepios e de aromas. 
  
        ARLEQUIM diz: 
Foi assim: deslumbrava a fidalga beleza da turba nos salões da Senhora Duquesa. 
Um cravo, em tom menor, numa voz quase  humana, tecia o madrigal de uma antiga pavana.  Eu descera ao jardim. Cheirava a heliotrópio e vi, como quem vê num vago sonho de ópio, uma loura mulher... 
     PIERROT 
     Loura? 
     ARLEQUIM 
                                                                                                                Como as espigas... 
Como os raios de sol e as moedas antigas...Notei-lhe, sob o luar, a cabeleira crespa,  
anca em forma de lira e a cintura de vespa, um cravo no listão que o seio lhe bifurca, 
pezinhos de mousmé, olhos grandes, de turca... A boca, onde o sorriso era como uma abelha, recendia tal qual uma rosa vermelha. 
        
     PIERROT 
        
Falaste-lhe? 
        
     ARLEQUIM 
        
 Falei... 
        
     PIERROT 
        
     E a voz? 
        
     ARLEQUIM 
        
                                                                                  Vaga e fugace. 
Tinha a voz de uma flor, se acaso a flor falasse... 
     PIERROT 
E depois? 
        
     ARLEQUIM 
     Eu fiquei, sob a noite estrelada, decidido a ousar tudo e não ousando nada... 
Vinha dela, pelo ar, espiritualizado numa onda volúpia, um cheiro de pecado... 
Tinha a fascinação satânica, envolvente, que tem por um batráquio o olhar duma serpente... e fiquei, mudo e só, deslumbrado e tristonho, sentindo que era real o que eu julgava um sonho! Em redor o jardim recendia. 
          Umas poucas 
tulipas cor de sangue, abertas como bocas, pela voz do perfume insinuavam perfídias... 
Tremia de pudor a carne das orquídeas... Os lírios senhoreais, esbeltos como galgos,  
abriram para o céu cinco dedos fidalgos fugindo à mão floral do cálix longo e fino. 
Um repuxo cantava assim como um violino e, orquestrando pelo ar as harmonias rotas, desmanchava-se em sons, ao desfazer-se em gotas! Entre a noite  e a mulher, eu trêmulo hesitava: se a noite seduzia, a mulher deslumbrava! 
Dei uns passos 
     Ao ruído agitou-se assustada.     Viu-me... 
     PIERROT 
    E ela que fez? 
     ARLEQUIM 
      Deu uma gargalhada. 
     PIERROT 
 Por que? 
     ARLEQUIM 
Sei lá! Mulher...Talvez porque ela achasse ridículo Arlequim com ar de Lovelace... 
Aconcheguei-me mais: “Deus a guarde, Senhora!” 
-  Obrigada.  Quem és? 
 - “Um arlequim que a adora!” 
Vinha do seio dela, entre a renda e a miçanga, um cheiro de mulher e um cheiro de cananga. Eram os olhos seus, sob a fronte alva e breve, como dois astros de ouro a arder num céu de neve. Mordia, por não rir, o lábio úmido e langue, vermelho como um corte inda vertendo sangue...E falei-lhe de amor... 
     PIERROT 
     E ela? 
     
     ARLEQUIM 
        Ficou calada... 
Meu amor disse tudo, ela não disse nada, mas ouviu , com prazer, a frase que renova 
no amor que é sempre velho, a emoção sempre nova! 
     PIERROT 
Que lhe disseste enfim? 
     ARLEQUIM 
O ardor do meu desejo, 
a glória de arrancar dos seus lábios um beijo,  a volúpia infernal dos seus olhos 
devassos, o prazer de a estreitar , nervoso, nos meus braços, de sentir a lascívia heril dos seus meneios, esmagar no meu peito a carne dos seus seios! 
     PIERROT, assustado: 
Tu ousaste demais... 
     ARLEQUIM, cínico: 
      Ingênuo!  A mulher bela  
adora quem lhe diz tudo o que é lindo nela. Ousa tudo, porque todo o homem enamorado se arrepende, afinal, de não ter tudo ousado. 
      PIERROT 
E ela? 
      ARLEQUIM 
  Vinha pelo ar, dos zéfiros no  adejo, um perfume de amor lascivo como um beijo, como se o mundo em flor vibrasse, quente e vivo, no erotismo triunfal de um amor coletivo! 
  
      PIERROT, fremindo: 
E ela? 
      ARLEQUIM 
Ansiando, ouviu toda essa paixão louca, levantou-se... 
      PIERROT 
    Depois? 
      ARLEQUIM , triunfante: 
    Deu-me um beijo na boca! 
    Um silêncio cheio de frêmito. Os lírios tremem. Pierrot  
    olha o crescente. Arlequim dá um passo, vê a brandura, 
    toma-a entre as mãos nervosas e magras e tange, distraído,  
    as cordas que gemem. 
      ARLEQUIM 
 Linda viola. 
      PIERROT, alheado: 
    Bom som... 
     ARLEQUIM 
     Que musicais surpresas não encerra a mudez 
destas cordas retesas... 
    Confidencial a Pierrot: 
Olha: penso, Pierrot, que não existe em suma, entre a viola e a mulher, diferença nenhuma.  Questão de dedilhar, com certa audácia e calma, numa...estas cordas de aço, e na outra...as cordas d’alma! 
    Suavemente, exaltando-se: 
O beijo da mulher! Ó sinfonia louca da sonata que o amor improvisa na boca... No contado do lábio, onde a emoção acorda, sentir outro vibrar, como vibra uma corda...  À vaga orquestração da frase que sussurra ver um corpo fremir tal qual uma bandurra...Desfalecer ouvindo a música que canta no gemido de amor que morre na garganta...Colar o lábio ardente à flor de um seio lindo, ir aos poucos subindo...ir aos poucos subindo...até alcançar a boca e escutar, num arquejo, o  universo parar na síncope de um beijo! 
......................................................................................................................................... 
Eis toda a arte de amar! Eis, Pierrot fantasista, a suprema criação da minha alma de artista.  Compreendes? 
     PIERROT, ansiado: 
    E a mulher? 
     ARLEQUIM, lugubremente: 
       A mulher? É verdade... 
Levou naquele beijo a minha mocidade. 
     PIERROT 
 E agora? Onde ela está? 
     ARLEQUIM, ironicamente místico: 
       No meu lábio, no ardor desse beijo, que é todo um romance de amor! 
     
     Seduzido pela angústia da saudade: 
No temor de pedi-lo e na glória de tê-lo... 
No gozo de prová-lo e na dor de perdê-lo... 
No contato desfeito e no rumor já mudo... 
No prazer que passou...Nesse nada que é tudo:  
O passado!...  a lembrança...    a saudade...   o desejo... 
     Balbuciando: 
  Um jardim... Um repuxo...Uma mulher... Um beijo.... 
  
  (Longo silêncio cheio de evocação e de cismas). 
     PIERROT, ingenuamente: 
    É audaciosa demais a tua história... 
 
 
 
 
  
     ARLEQUIM, ríspido: 
         Enfim, 
um Arlequim, Pierrot, é sempre um Arlequim. Toda história de amor só presta se tiver, como ponto final, um beijo de mulher! 
  
O SONHO DE PIERROT 
  
II 
  
     PIERROT 
Eu também, Arlequim, nesta vida ilusória, como todos Pierrots, eu tenho uma história, vaga, talvez banal, mas triste como um cântico... 
     ARLEQUIM, sarcástico: 
Não compreendo um Pierrot que não seja romântico, branco como o marfim, magro como um caniço, enchendo o mundo de ais, sem nunca passar disso. 
      PIERROT 
Debochado Arlequim! 
      ARLEQUIM 
       Branco Pierrot tristonho... 
  
      PIERROT 
 Teu amor é lascívia! 
      ARLEQUIM 
       E o teu amor é sonho... 
      PIERROT 
É tão doce sonhar!... A vida , nesta terra, vale apenas, talvez, pelo sonho que encerra. Ver vaga e espiritual, das cismas nos refolhos, toda uma vida arder na tristeza de uns olhos; não tocar a que se ama e deixar intangida aquela que resume a nossa própria vida, eis o amor, Arlequim. , misticismo tristonho, que transforma a mulher na incerteza de um sonho.... 
  
      ARLEQUIM, escarninho: 
Esse amor tão sutil que teus nervos reclama só se aplica aos Pierrots? 
      PIERROT 
       Não! A todos os que amam! 
Aos que têm esse dom de encontrar a delícia na intenção da carícia e nunca na carícia...Aos que sabem, como eu, ver que no céu reflete a curva do crescente, um vulto de Pierrette... 
      ARLEQUIM,  zombeteiro: 
Eterno sonhador! Tu crês que vive a esmo tudo aquilo que sai de dentro de ti mesmo. Vês, se fitas o céus, garota e seminua, Colombina sentada entre os cornos da lua...Quanta vezes não viste o seu olhar abstrato nos fosfóreos vitrais das pupilas de um gato? 
      PIERROT 
Essas frases cruéis, que mordem como dentes, só mostram, Arlequim, que somos diferentes. Mas minha alma, afinal, é compassiva e boa: não compreendes Pierrot. E Pierrot  te perdoa... 
      ARLEQUIM 
Tua história, vai lá! Senta-te nesse banco. Conta-me: “Era uma vez um Pierrot muito branco...” 
A história de um Pierrot sempre nisso consiste... Começa. 
      PIERROT narrando: 
“Era uma vez...  um  Pierrot...       muito triste... “ 
   Uma voz, na distância, corta, argentina, a narração  de Pierrot. 
      A VOZ 
     Foi um moço audaz, que vejo 
     no meu sonho claro e doce, 
O amor que primeiro amei.. 
Abraçou-me: deu-me um beijo 
e, depois, lento, afastou-se, 
e nunca mais o encontrei. 
 
  
Num ser pálido e doente 
resume-se o que consiste 
o segundo amor que amei. 
Ele olhou-me tristemente... 
Eu olhei-o muito triste... 
E nunca mais o encontrei! 
Esse amor deu-me o desejo 
daquele beijo encontrar. 
Mas nunca, reunidas, vejo, 
a volúpia desse beijo, 
e a tristeza desse olhar... 
 A voz agoniza nos ecos. Pierrot e Arlequim tendem o ouvido procurando no ar mais uma estrofe. 
 ARLEQUIM 
  Essa voz... 
    PIERROT 
  Essa voz... 
      ARLEQUIM 
   Só de ouvi-la estremeço... 
     PIERROT 
     Eu conheço essa voz! 
      ARLEQUIM 
       Essa voz eu conheço... 
    Um sopro de brisa arrepia as plantas. 
   PIERROT 
 Escuta... 
      ARLEQUIM 
  Escuta... 
  
      PIERROT 
  Ouviste? 
      ARLEQUIM 
    Um sussurro... 
     PIERROT 
     Um lamento... 
     
      ARLEQUIM 
       Foi o vento talvez. 
      PIERROT 
   Sim.  Talvez fosse o vento. 
      ARLEQUIM 
Conta a história, Pierrot. 
     Pierrot continuando: 
       Numa noite divina 
como tu, num jardim, encontrei Colombina. Loira como um trigal e branca como a lua. 
     ARLEQUIM 
Era loira também? 
     PIERROT 
       Tão loira como a tua... 
Eu descera ao jardim quebrado de fadiga. Dançavam no salão... 
     ARLEQUIM, interrompendo: 
       ... uma pavana antiga, 
e notaste ao luar a cabeleira crespa... 
     PIERROT 
   ... a anca em forma de lira... 
      
  
ARLEQUIM 
    ...  e a cintura de vespa! 
     PIERROT 
   Mãos mimosas, liriais... 
     ARLEQUIM 
    Em minúcias te expandes! 
     
     PIERROT 
     Um pé muito pequeno... 
     ARLEQUIM 
        Uns olhos muito grandes! 
Uma mulher igual à que encontrei na vida? 
     PIERROT, ofendido: 
Enganas-te, Arlequim, nem mesmo parecida! 
Era tal a expressão do seu olhar profundo,  
que não pode existir outro igual neste mundo! 
Felinamente ardia a íris verdoenga e dúbia, 
como o sinistro olhar de uma pantera núbia. 
Esses olhos fatais lembravam traiçoeiras 
feras, armando ardis nos fojos das olheiras! 
Tão vivos que, Arlequim, desvairado, os supus 
duas bocas de treva e erguer brados de luz! 
Tripudiavam o bem e o mal nos seus refolhos. 
     ARLECRIM, cismando: 
Essas coisas também ardiam nos seus olhos... 
     PIERROT 
Tive medo, Arlequim! Vendo-os, num paroxismo 
eu tinha a sensação de estar sobre um abismo. 
Não sei porque o olhar dessa estranha criatura  
era cheio de horror...e cheio de doçura! 
Eu desejava arder nessas chamas inquietas... 
  
     ARLEQUIM 
   Tendo o fim dos Pierrots? 
     PIERROT 
     Tendo o fim dos Poetas! 
Aconcheguei-me dela, a alma vibrante louca, o coração batendo... 
     ARLEQUIM 
    E beijaste-lhe a boca. 
     PIERROT, cismarento: 
Não...Para que beijar? Para que ver, tristonho, no tédio do meu lábio o vácuo do meu sonho... Beijo dado, Arlequim, tem amargos ressábios... 
Sempre o beijo melhor é o que fica nos lábios, 
esse beijo que morre assim como um gemido, 
sem ter a sensação brutal de ser colhido... 
     ARLEQUIM 
  E que disse a mulher? 
     PIERROT 
    Suspirou de desejo... 
     ARLEQUIM , mordaz: 
  Preferia, bem vês, que lhe desses um beijo! 
     PIERROT 
 Não. Ela olhou-me. Olhei... E vi que, comovida, sentiu que , nesse olhar, eu punha a minha vida... 
    Um silêncio cheio de angústias vagas. 
    Sob o luar claro as almas brancas dos 
    Lírios evocam fantasmas de emoções 
    mortas. Os espectros das memórias 
    parecem recolher, como numa urna invi- 
    sível, a saudade romântica de Pierrot... 
 
 
  
      ARLEQUIM, tristonho: 
Essa história, Pierrot, é um pouco merencória... 
      PIERROT 
   A história desse olhar é toda a minha história. 
      ARLEQUIM 
  E não a viste mais? 
      PIERROT 
   Nem sei mesmo se existe... 
      
      ARLEQUIM, contendo o riso: 
É de fazer chorar! Tudo isso é muito triste! 
    Tomando-o pelo braço, confidencialmente: 
Entretanto, ouve aqui, à guisa de consolo: 
diante dessa mulher...foste um Pierrot bem tolo! 
Aprende, sonhador! Quando surgir o ensejo, 
entre um beijo e um olhar, prefere sempre um beijo! 
     PIERROT, desconsolado: 
Lamentas-me Arlequim? 
     ARLEQUIM 
Tu não compreendeste: choro não ter colhido  o beijo que perdeste. 
  
  O AMOR DE COLOMBINA 
  
II 
     Uma voz que canta se aproxima. 
      A VOZ 
  Esse olhar deu-me o desejo 
  daquele beijo encontrar, 
  mas nunca , reunidas, vejo 
  a volúpia desse beijo 
  e a tristeza desse olhar! 
      PIERROT , extasiado: 
   Escutaste, Arlequim, que cantiga tão bela? 
      ARLEQUIM 
    Era dela esta voz? 
      PIERROT 
     Esta voz era dela... 
   Arlequim está imerso na sombra e um raio de luar ilumina 
   Pierrot. Entra Colombina trazendo uma braçada de flores. 
     COLOMBINA,  vendo Pierrot: 
   Tu? Que fazes aqui? 
    PIERROT 
Espero-te, divina...A sorte de um Pierrot é esperar Colombina! 
     COLOMBINA 
Pela terra florida, olhos cheios de pranto, eu procurei-te muito... 
    PIERROT 
     E eu esperei-te tanto! 
     COLOMBINA 
Onde estavas, Pierrot? Entre as balsas amigas, tendo no peito um sonho e no lábio cantigas, dizia a cada flor:  “Mimosa flor, não viste um Pierrot muito branco...” 
      
     PIERROT 
    Um Pierrot muito triste... 
     COLOMBINA 
E respondia  a flor: “Sei lá... Nestas campinas passam tantos Pierrots atrás de Colombinas...” E eu seguia e indagava: “Ó regato risonho: não viste, por acaso, o Pierrot do meu sonho? “ E o regato correndo e cantando, dizia: “Coro e canto e não vejo” -  e cantava e corria...  Nos céus, ergendo o olhar, eu via, esguio e doente, o pálido Pierrot recurvo do crescente... 
Assim te procurei, entre as balsas amigas, tendo no peito um sonho e  no lábio cantigas, só porque, meu amor, uma noite, num banco, eu encontrara olhar de um triste Pierrot branco. 
   
     PIERROT 
Não! Não era um olhar! Ardia nessa chama 
toda a angústia interior do meu peito que te ama 
Nosso corpo é tal qual uma torre fechada 
onde sonha , em seu bojo, uma alma encarcerada. 
Mas se o corpo é essa torre em carne e sangue erguida, 
O olhar é uma janela aberta para a vida, 
e, na noite de cisma, enevoada e calma, 
na janela do olhar se debruça nossa alma 
  
   COLOMBINA, languidamente abraçada a Pierrot: 
Olha-me assim, Pierrot... Nada mais belo existe 
que um Pierrot muito branco e um olhar muito triste... 
Os teus olhos, Pierrot, são lindos como um verso. 
Minh’alma é uma criança, e teus olhos um berço 
com cadências de vaga e, à luz do teu olhar, 
tenho ânsias de dormir, para poder sonhar! 
Olha-me assim, Pierrot... Os teus olhos dardejam! 
São dois lábios de luz que as pupilas me beijam... 
São dois lagos azuis à luz clara do luar... 
São dois raios de sol prestes a agonizar... 
Olha-me assim Pierrot... Goza a felicidade 
de poluir com esse olhar a minha mocidade 
aberta para ti como uma grande flor, 
meu amor...meu amor...meu amor... 
    PIERROT 
     Meu amor! 
   Colombina e Pierrot abraçam-se ternamente. Há, como 
   um cicio de beijos, entre os canteiros dos lírios. Arlequim, 
   vendo-os, sai da treva e, com voz firme, chama. 
    ARLEQUIM 
Colombina! 
    COLOMBINA, voltando-se assustada: 
  Quem é? 
  
    ARLEQUIM 
    Sou alguém, cuja sina foi amar, com Pierrot, a mesma 
Colombina. Alguém que, num jardim, teve o sublime ensejo de beijar-te e jamais se esquecer desse beijo! 
    COLOMBINA, desprendendo-se de Pierrot: 
   Tu, querido Arlequim! 
    ARLEQUIM, galanteador: 
Arlequim que te adora...Que te buscava há tanto e que te encontra agora. 
    COLOMBINA 
  E procurei-te em vão, mas te esperava ainda. 
    ARLEQUIM a Pierrot: 
Ela está mais mulher... 
    PIERROT num êxtase: 
   Ai! Ela está mais linda! 
    ARLEQUIM, enfatuado, a Colombina: 
És linda, meu amor!  Nessa formas perpassa 
na cadência do Ritmo, a leveza da Graça. 
Teus braços musicais, curvos como perfídia, 
têm a graça sensual de uma estátua de Fídias. 
Não sendo inda mulher, nem sendo mais criança, 
encarnas, grande viva, a Flor de Liz de França... 
Sobe da anca uma curva ondulante que chega  
a teu corpo plasmar como uma ânfora grega 
e é teu vulto triunfal, longo, heráldico, esgalgo, 
coleante como um cisne  e esbelto como um galgo! 
    COLOMBINA, fascinada: 
  Lindo! 
    ARLEQUIM 
E não disse tudo... E não disse do riso 
boêmio como ébrio e claro como um guizo. 
E ainda não falei dessa voz de sereia 
que, quando chora, canta, e quando ri, gorjeia... 
Não falei desse olhar cheio de magnetismo, 
que fulge como um astro e atrai como um abismo, 
e do beijo, que como uma carícia louca... 
inda canta em meu lábio e inda sinto na boca! 
 COLOMBINA com um voz sombria de volúpia: 
Fala mais, Arlequim! Tua voz quente e langue  
tem lascivo sabor de pecado e de sangue. 
O venenoso amor que tua boca expele, 
põe-me gritos na carne e arrepios na pele! 
Fala mais, Arlequim! Quando te escuto, sinto 
O desejo explodir das potências do instinto, 
 O brado da volúpia insopitada, a fúria, 
do prazer latejando em uivos de luxúria! 
Fala mais, Arlequim! Diz o ardor que enlouquece 
 a amada que se toca e aos poucos desfalece, 
e que, cega de amor, lábio exangue, olhar pasmo, 
agoniza num beijo e morre num espasmo. 
Fala mais, Arlequim! Do monstruoso transporte  
que, resumindo a vida, anseia pela morte, 
dessa angústia fatal, que é o supremo prazer 
da glória de se amar, para depois morrer! 
    PIERROT, num soluço: 
  Ai de mim!... 
    COLOMBINA, como desperta: 
  Tu Pierrot! 
    PIERROT, num fio de voz: 
      Ai de mim que, tristonho, trazia 
à tua vida a oferta do meu sonho...Pouca coisa, porém... Uma alma ardente e inquieta arrastando na terra um coração de poeta. 
Na velha  Ásia, a Jesus, em Belém, um Rei Mago, não tendo outro partiu através de 
Cartago, atravessando a Síria, o Mar Morto infinito, a ruiva e adusta Líbia, o mudo e fulvo Egito, as várzeas de Gisej, o Hebron fragoso e imenso, só para lhe ofertar uns grânulos de incenso... Também vim, sonhador, pela vida, tristonho, trazer-te o meu amor no incenso do meu sonho. 
    COLOMBINA  com ternura: 
     Como te amo, Pierrot... 
     
    ARLEQUIM 
      E a mim, cujo desejo te abriu o coração com a chave do meu beijo? A tua alma era como a Bela Adormecida: o meu beijo a acordou para a glória da vida! 
    CALOMBINA  fascinada: 
   Como te amo, Arlequim!... 
      PIERROT 
     desvairado pelo ciúme, apertando-lhe os pulsos, 
     numa voz estrangulada:  
      A incerteza que esvoaça desgraça muito mais do que a própria desgraça. Escolhe entre nós dois... Bendiremos os fados sabendo o que é feliz, entre dois desgraçados! 
      ARLEQUIM 
Dize: Queres-me bem? 
      PIERROT: 
   Fala: gostas de mim? 
     COLOMBINA, hesitante: 
 A Pierrot: 
  Eu amo-te , Pierrot... 
      A Arlequim: 
       ... Desejo-te, Arlequim... 
    ARLEQUIM, soturnamente: 
A vida é singular! Bem ridícula, em suma... Uma só, ama dois... e dois amam só uma!.. 
   COLOMBINA , sorrindo e tomando ambos pela mão: 
Não! Não me compreendeis... Ouvi, atentos, pois meu amor se compõe do amor de todos dois... Hesitante, entre vós, o coração balanço: 
  
   A Arlequim: 
O teu beijo é tão quente...                         
        A Pierrot: 
       O teu sonho é tão manso... 
Pudesse eu repartir-me e encontrar minha calma dando a Arlequim meu corpo e a Pierrot a minh’alma!  Quando tenho Arlequim, quero Pierrot tristonho, pois um dá-me o prazer, o outro dá-me o sonho! 
Nessa duplicidade o amor todo se encerra: um me fala do céu... outro fala da terra! 
Eu amo, porque amar é variar, e em verdade toda a razão do amor está na variedade... 
Penso que morreria o desejo da gente, se Arlequim e Pierrot fossem um ser somente, 
porque a história do amor pode escrever-se assim:  
    PIERROT 
Um sonho de Pierrot... 
    ARLEQUIM 
      
     E um beijo de Arlequim!

( Fonte: http://www.revista.agulha.nom.br/mpicchia04p.html )

Menotti Del Picchia

        Paulo Menotti Del Picchia nasceu em 20 de março de 1892 na capital paulista.
Cursou Direito, formando-se em 1913. Nesta época publicou seu primeiro livro de poesias: Poemas do vício e da virtude, de conteúdo neoparnasiano. Trabalhou em diversos jornais e revistas, sendo redator e dirigindo alguns deles, como o Correio Paulistano, o semanário literário O Planalto e as revistas Papel e Tinta e a A Cigarra.
        Menotti Del Picchia participou ativamente da Semana de Arte Moderna em 1922, sendo não apenas um dos articuladores, como também arrebatado militante do movimento modernista brasileiro. Em 1924 criou, com Cassiano Ricardo e Plínio Salgado, o Movimento Verde e Amarelo, de tendência nacionalista. Foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras em 1943. Além de se dedicar à carreira literária, Menotti Del Picchia foi artista plástico, deputado estadual e jornalista.
        Faleceu em 23 de agosto de 1988, em São Paulo.
Algumas Obras: Juca Mulato, Moisés, As máscaras, A revolução paulista, Salomé, A outra perna do Saci, A longa viagem.

( Fonte: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/bibliotecas/bibliotecas_bairro/bibliotecas_m_z/menottidelpicchia/index.php?p=5416 )

Victor Brecheret

Monumento às Bandeiras, sua obra mais célebre.
          Victor Brecheret (Farnese, 22 de fevereiro de 1894São Paulo, 17 de dezembro de 1955) foi um escultor ítalo-brasileiro, considerado um dos mais importantes do país.1 É responsável pela introdução do modernismo na escultura brasileira. Sua figura ficou marcada pela boina que costumava vestir, ressaltando uma imagem tradicional do "artista".
Nascido "Vittorio Breheret" (sem a letra 'c' no sobrenome) numa pequena localidade não distante de Roma, filho de Augusto Breheret e Paolina Nanni, esta última falecida quando o pequeno Vittorio tinha apenas seis anos de idade. Foi abrigado pela família do tio materno, Enrico Nanni, e com sua família emigrou para o Brasil ainda na infância.
         No Brasil, tornou-se "Victor Brecheret" e já com mais de trinta anos de idade recorreu à Justiça para inscrever seu registro nascimento tardiamente no Registro Civil do Jardim América (município de São Paulo). Assim Brecheret consolidava a sua nacionalidade brasileira, embora tivesse nascido na Itália. Este tipo de "regularização" era muito comum entre imigrantes italianos na primeira metade do século XX no Brasil.
          Ainda moço frequentou as aulas de entalhe em gesso e mármore do Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, onde mais tarde viria a utilizar o ateliê e seus aprendizes para moldar suas obras. Amadureceu estudando na Europa, onde entrou em contato com as vanguardas artísticas que ocorriam nas décadas de 1910 e 1920. Trabalhou com o escultor italiano Arturo Dazzi, sendo influenciado pela estética de pós-impressionistas como Ivan  Meštrović, croata, e os franceses Auguste Rodin e Émile-Antoine Bourdelle.1 Ligou-se a  Emiliano Di Cavalcanti, Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Menotti del Picchia quando voltou ao Brasil e com eles participou da introdução do pensamento vanguardista no Brasil.
          Participou da Semana de Arte Moderna de 1922, expondo vinte esculturas no saguão e nos corredores do Teatro Municipal de São Paulo. A partir daí manteve paralelamente uma carreira na Europa e em seu país. Expôs no Salão dos Independentes de Paris e fundou a Sociedade Pró Arte Moderna.
         Em 1920 ganhou um concurso internacionale de maquetes para a construção de uma grande escultura em São Paulo (o futuro Monumento às Bandeiras). Em 1923 o governo do Estado de São Paulo encomendou-lhe a execução do Monumento às Bandeiras, projeto a que Brecheret viria a se dedicar nos vinte anos seguintes. O Monumento às Bandeiras foi a maior obra de Brecheret e demorou 33 anos para ser construído (1920—1953). Em 1932, torna-se sócio-fundador da Sociedade Pró-Arte Moderna (Spam).
Em 1951 foi premiado como o melhor escultor nacional na primeira Bienal de São Paulo.

Obra

       Quando estudante do Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, Brecheret foi essencialmente um artesão, executando obras de teor clássico e romântico.

       Na Europa, iniciou uma produção similar a de pós-impressionistas. Ao entrar em contato com as vanguardas em curso naquela época no continente europeu, passou a expressar sua obra com manifestações vindas do construtivismo, expressionismo e cubismo, mas nunca chegando à abstração pura. Em sua fase mais madura, Victor procurou realizar experimentos estéticos que ligavam a escultura vernacular indígena brasileira com as experiências que desenvolveu na Europa.
Em sua produção destacam-se:
  • "Idolo" (1921)
  • "Fauno" (1942)
  • "Depois do Banho" (1945)
  • "O Índio e Sasuapara" (1951)
  • "Monumento às Bandeiras" (1953)
  • "Monumento a Duque de Caxias" (1960)

 

 ( Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Victor_Brecheret )

Anita Malfatti

       
       Anita Catarina Malfatti nasceu em 2 de dezembro de 1889, em São Paulo. Filha de Samuel Malfatti e de Elisabete, era pintora, desenhista e falava vários idiomas, o que lhe rendia uma habilidade cultural vasta. 
      Chegando a Berlim, em setembro de 1910, começou a tomar aulas particulares no ateliê de Fritz Burger, matriculando-se um ano depois na Academia Real de Belas-Artes. Em 1916 retornou ao Brasil, já com 27 anos, disposta a expressar toda sua arte, especialmente voltada para o Expressionismo. 
     Assim, por meio de influências de seus amigos modernistas, em especial por Di Cavalcanti, Anita decidiu locar uma das dependências do Mappin Stores e realizar uma única apresentação de seus trabalhos, em 12 de dezembro de 1917. 
      O que não sabia era que o destino, de forma irônica, lhe reservara um grande infortúnio. Monteiro Lobato, por meio de seu artigo Paranoia ou mistificação, criticou a duras penas o trabalho da artista. Tal intento não era destinado a ela em especial, mas aos modernistas propriamente ditos. O fato lhe abalou profundamente e a fez carregar pelo resto de sua vida um sentimento de total descontentamento frente às coisas que a rodeavam. Seu primeiro instinto foi o de abandonar de vez a arte, contudo passou a tomar aulas com o mestre Pedro Alexandrino, fato que lhes concedeu uma proveitosa e duradoura amizade.
      Motivada por amigos, resolveu participar da Semana de Arte Moderna de 1922 e, no ano seguinte, viajou para Paris, munida de uma bolsa de estudos, onde encontrou Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade, Vitor Brecheret e Di Cavalcanti. Retornou depois de algum tempo ao solo brasileiro, já com a confiança recuperada, no entanto não estava mais disposta em se aventurar em novas “investidas culturais”.  
      Anita veio a falecer em 6 de novembro de 1964 em Diadema, estado de São Paulo, local em que morava com sua irmã Georgina, em uma chácara. 

Obras de Anita Malfatti

Paisagem, 1915-1917 (EUA, Costa do Maine)

      Um dos períodos de maior produção artística de Anita Malfatti foi durante sua estadia nos Estados Unidos, quando a artista se isolou numa ilha de pescadores na Costa do Maine chamada Monhegan Island (nome que serve de subtítulo a um dos quadros da época: Rochedos). Anita vivia com outros pintores que trabalhavam sob a orientação do pintor e filósofo Homer Boss, da Independent School of Art.

Rochedos (Monhegan Island). 1915. oléo s/ tela (60x74) .Col. Guilherme Malfatti, SP
        Anita passava os dias pintando ao ar livre, e ao anoitecer ouvia as aulas inspiradas de Homer Boss. Nesse ambiente de liberdade e inspiração, a artista explorou as influências expressionistas adquiridas durante seu aprendizado anterior na Alemanha. Em obras como A Ventania e A Onda , a paisagem local é representada como uma força selvagem, agressiva e dinâmica, e o uso da deformação expressa certa inquietação do olhar humano diante da natureza.

A Ventania. 1915-17. óleo s/ tela (51x61). Col. Palácio dos Bandeirantes, SP.
A Onda. 1915-17. óelo s/ madeira (26,5x36). Col. Paulo Prado Neto, SP.















        
         Uma das obras mais conhecidas desse período é O Farol. Nessa pintura, assim como em O Barco, a paisagem está mais harmonizada com a presença humana,  através das edificações que compõem o cenário. O uso da deformação é sensivelmente menor, em contrapartida Anita utiliza exemplarmente a principal característica do seu expressionismo: as cores abundantes e vivas, a chamada “Festa da Cor”.
O Farol. 1915. óleo s/ tela (46,5x61). Col. Chateaubriand Bandeira de Mello, RJ.

O Barco. 1915. óleo s/ tela (41x46). Col. Raul Sousa Dantas Forbes, SP.
               

Retratos, 1915-17 (EUA).



        Entre as obras que fomentaram as polêmicas em torno da lendária exposição de 1917, certamente estão muitos dos retratos pintados por Anita.
A estudante russa. 1915. óleo s/ tela (76x61). Col. Mário de Andrade, Instituto de Estudos Brasileiros da USP, SP.



        Tanto nas paisagens quanto nos retratos, a cor é o principal instrumento da jovem Anita Malfatti. A obra O homem de sete cores revela essa preocupação intensa, e essa técnica também irá produzir grandes telas como A boba.
O homem de sete cores. 1915-16. Carvão e pastel s/ papel (60,7x45). Col. Roberto Pinto de Souza, SP.


A boba. 1915-16. Óleo s/ tela (61x50,5). Col. Museu de Arte 
Contemporânea da USP, SP.
               

           Anita utilizava modelos que posavam na Independent School of Art em troca de alguns dólares. Essas pessoas, sem nenhuma ligação com o mundo artístico, serviriam como modelos para obras como A mulher de cabelos verdes e O homem amarelo, obra que fascinou Mario de Andrade, quando este sequer conhecia Anita.

   A mulher de cabelos verdes. 1915-16. óleo s/ tela (61x51). Col. Ernesto Wolf, SP.


                          



O homem amarelo. 1915-16. óleo s/ tela (61x51). Col. Mário de Andrade, Instituto de Estudos Brasileiros da USP, SP.

                            

          Nessas obras, assim como em Uma estudante, Anita revela o seu interesse em retratar o estado psicológico dos seus modelos. O uso de certa deformação moderada, fugindo dos modelos clássicos, causou grande alvoroço em Monteiro Lobato e na elite provinciana de São Paulo.
Uma estudante. 1915-16. óleo s/ tela (76,5x60,5). Col. Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, SP.

Retratos, 1921-27 (Brasil, França).



          A recepção negativa da Exposição de 1917 fez com Anita recuasse nas suas propostas inovadoras para a pintura,  assim como afastou a possibilidade de alcançar o Pensionato Artístico do Estado de São Paulo, almejado pela artista desde 1914. No entanto, apesar do escândalo geral, algumas forças ansiosas por renovação cultural já procuravam apoiar e defender a artista. Entre eles está Mario de Andrade (retrato abaixo), grande admirador da pintora, que após a Semana de Arte Moderna de 22 cresceu em importância no cenário cultural paulista. Foi por intermédio de Mario de Andrade que Anita conseguiu o Pensionato Artístico do Estado de São Paulo, e em 1923 a pintora partiu para a França.
Mario de Andrade I. 1921-22. óleo s/ tela (51x41). Col. Particular, SP.
            


          Anita também retratou outros de seus amigos, inclusive a escritora portuguesa Fernanda de Castro. No entanto, muitas de suas composições eram inspiradas em anônimos, vistos ao acaso pela rua, que chamavam a atenção da artista. Entre elas estão a Chanson de Montmartre e Mulher do Pará.
Fernanda de Castro. 1922. óleo s/ tela (73,5x54,5). Col. Marta Rossetti Batista, SP.


Chanson de Montmartre. 1926. óleo s/ tela (73,3x60,2). Col. Roberto Pinto de Souza, SP.


MulherdoPará(nobalcão).1927.óleostela.80x65.Col.JennerAugustoSilveira.Salvador.
Mulher do Pará (no balcão). 1927. óleo s/ tela (80x65). Col. Jenner Augusto Silveira, Salvador.

Paisagem, 1924-26 (França, Pensionato Artístico).

          Ao receber o Pensionato Artístico do Estado de São Paulo, graças ao seu apoiador Mario de Andrade, Anita parte para a França, para retomar seus estudos e dedicar-se unicamente à pintura (no Brasil, ela lecionara artes plásticas e pintara sob encomenda para sobreviver).
Porto de Mônaco. 1925-26. óleo s/ tela (80x64,5). Col. Jenner Augusto Silveira, BA.


          A artista também viajaria para a Itália, onde iniciaria um processo de estudo dos clássicos, inclusive realizando réplicas e versões de pintores renascentistas, além de retratar a paisagem local.
Paisagem dos Pirineus (Cauterets). 1926. óleo s/ tela (45,8x54,8). Col. Liliana Maria Assumpção, SP.


Veneza (Canaleto). 1924. óleo s/ tela (51,5x63). Col. Museu de Arte Brasileira da FAAP, SP.


         Apesar do recuo da atitude de vanguarda, Anita ainda era capaz de produzir grandes obras, sem abandonar a sua influência do humanismo expressionista, revelando a preocupação introspectiva e psicológica da artista.
La rentrée (interior). 1925-27. óleo s/ tela (88x115). Col. Pedro Tassinari Filho, SP.

Paisagem, 1940-49 (Brasil).

          No final da sua carreira, Anita transforma radicalmente seu jeito de pintar. Ela declara querer abandonar as fórmulas internacionais, e pintar de forma cada vez mais simples. A temática também muda: a instrospecção, e os retratos de forte expressão psicológica são substituídos pela representação da “alma brasileira”. Segundo a própria artista: “É verdade que eu já não pinto o que pintava há trinta anos.       Hoje faço pura e simplesmente arte popular brasileira. É preciso não confundir: arte popular com folclore. (…) eu pinto aspectos da vida brasileira, aspectos da vida do povo. Procuro retratar os seus costumes, os seus usos, o seu ambiente. Procuro transportá-los vivos para as minhas telas. Interpretar a alma popular (…) eu não pinto nem folclore, nem faço primitivismo. Faço arte popular brasileira”
As duas Igrejas (Itanhaém). 1940. óleo s/ tela (53,8x66). Col. Particular, SP.


Cambuquira. 1945. óleo s/ tela (50x61,1). Col. Museu de Arte Contemporânea da USP, SP.


          Anita procurava transmitir a “ternura brasileira” que não encontrava na arte da época. Para transmitir essa mensagem, achou que a sua técnica antiga era “muito violenta, inacessível à massa” – assim, procurava uma técnica simples, acessível a todos. Procurou cada vez mais esquecer escolas, teorias. Chegaria a declarar, em 1957, que estava “tentando pintar apenas a vida, sem quaisquer preocupações artísticas”, concluindo mesmo: “Se conseguir fazer isso, estarei satisfeita”.
Itanhaém. 1948-49. óleo s/ tela (72x92). Col. Manuel Alceu Affonso Ferreira, SP.


Samba. 1943-45. óleo s/ tela (39,9x49,3). Col. Gabriel de Castro Oliveira, SP.

 


 (Fonte: http://obrasanitamalfatti.wordpress.com/ )